Um encontro com Fabio Haag
Ontem a tarde eu estava finalizando o texto que chamei de “quem somos?”, quando vi alguém caminhando em minha direção. Na realidade, ele era o motivo de eu estar no espaço Unisinos, aguardando.
Vinha lá, a distância, suave, sereno, alegre, o Fabio Haag. Ele estava chegando para tomarmos um café antes da palestra que havia combinado de ministrar para os alunos do projeto Desenhando Unisinos. Conversamos um pouco sobre alguns dos assuntos que nos unem: amigos, família, design, as coisas boas de Porto Alegre, educação. Quase as cinco horas, subimos para conversar com 25 alunos de Design, que estavam lá para ver esse cara, que é um dos principais nomes do Type Design.
Escrevo esse texto porque a palestra dele me ajudou um pouco a responder a pergunta do texto de ontem: quem somos?
Na realidade, aprender tem esse efeito em nós.
Um dia depois do outro, quando nos deixamos afetar pelas inúmeras oportunidades de aprender, mudamos. E provavelmente por isso, se eu escrevesse o texto de ontem novamente, o escreveria diferente.
Qual o nosso objetivo? O que é sucesso? O que buscamos?
O Fábio percorreu estas questões, a medida que contava sua trajetória: designer de grande sucesso internacional, resolveu deixar o escritório em que trabalhava e voltar para Sapiranga, onde montou um escritório que é referência na área de tipografia. Esse movimento se deu a partir da compreensão destas questões acima. Mas a principal ideia era retomar a possibilidade da liberdade que o tempo pode nos dar.
Vivemos hoje em uma sociedade em que o tempo nos limita. Hora para isso, para aquilo. Correria para buscar os filhos, tempo cronometrado para fazer o que gostamos. A ideia do Fábio era criar um ambiente em que as pessoas pudessem trabalhar, dentro de espaços de tempo autogerenciados e limitados a 5 horas por dia.
Quando ele falou sobre esse modelo, pude ver a surpresa no olhar dos alunos que ali estavam. Um modelo como esse, não está no nosso imaginário coletivo. Não faz parte do padrão universal que temos de emprego. Um padrão que tem como elemento central trabalhar horas sem parar, até conseguir entregar, exausto, algo razoável.
O tempo. O tempo no comando.
Eu já tive oportunidade de conversar sobre o tempo com pessoas que admiro demais. Lembro do episódio do podcast Edu Voices que gravei com o Ailton Krenak. Ele sempre trás a ideia do tempo flecha, que aponta para a frente, que tem como objetivo chegar em algum lugar, e que também ignora muitas vezes o agora. E também fala de um tempo muito mais interessante, o tempo circular, o tempo da ancestralidade. Lembro também de entrevistar o Emicida durante o festival POA 2020 e de perguntar para ele se ele buscava, através da atividades prazeirosas que tinha — como a sua horta — controlar o tempo. Ele disse que não. Eu fiquei pensando muito nisso, e me dei conta que essa ideia de controle, só passa por quem é controlado.
Na palestra do Fábio, vi ainda uma outra perspectiva do tempo: a liberdade. A ideia fundamental da proposta dele era abrir espaço para que as pessoas possam criar caminhos. No final das contas, o tempo, desaparece. Fiquei impressionado com toda a perspectiva de liderança que ele tem neste espaço, e estou simplificando muito isso neste texto, explorando apenas o aspecto do tempo.
Tivemos um momento único, com perguntas, comentários, mas acima de tudo com a sensação de que quando estamos juntos, criamos uma energia que pode impactar os outros, nós mesmos, e potencializar novos caminhos para todos. Eu senti um pouco isso ontem.
Falamos ontem com um cara que tem como clientes Globo, Ipiranga, Panvel, Bradesco, Banco do Brasil, Tramontina, para citar apenas alguns. E com muita simplicidade e sabedoria, ele trouxe para nós uma perspectiva transformadora do que é ser, e fazer design. Eu já admirava o Fabio, e agora admiro ainda mais.
Escrevo esse texto ouvindo, no repeat, uma das músicas que compartilhei com o Fabio e que me ajuda a focar.
Acho que toca pela quarta vez.
Mas isso pouco importa.
Por coincidência, a música chama Flight from the City “voo da cidade”, dom compositor Johann Johansson.
Para quem viu a palestra dele, tem uma conexão imensa. A partir desse olhar, podemos explorar a ideia de pertencimento, de lugar, de espaço que habitamos. Mas isso é assunto para outro momento.
Por aqui, ficamos apenas pensando no tempo.