Somos muitos

gustavo s de borba
3 min readApr 24, 2023

No livro Nós somos o clima, Jonathan Safran Foer apresenta uma série de histórias e de fatos históricos, para mostrar como podemos transformar a forma como nos relacionamos com nosso planeta. Embora o livro tenha como foco a crise ambiental, a perspectiva proposta no livro se aplica em diferentes contextos, como a necessária mudança na educação.

Foer diz que os fatos não são suficientes para mobilizar as pessoas. Por exemplo, sabemos o que está acontecendo com a terra, mas não realizamos mudanças significativas. Para o autor, e considerando a perspectiva de autores como Daniel Kahneman e George Marshall, é necessária uma conexão emocional com a questão em foco para que as pessoas efetivamente se mobilizam e construam uma mudança. A conexão entre razão (o fato) e emoção (a ação).

Esta compreensão é elemento fundamental para a mudança, mas a transformação precisa de outros caminhos.

Lembro de um debate bastante presente na área do design e da gestão, que diz respeito ao caminho para que mudanças duradouras acontecem. Alguns autores defendem um processo bottom-up, a partir de grupos sociais e que se amplia em soluções em rede, para transformar uma realidade. Outros trazem a ideia de uma mudança top-down, onde o governo ou líderes organizacionais dão exemplo e condições para uma transformação significativa.

O fato é que independente da origem do movimento, o movimento é impulsionado por ações individuais, que se desdobram em grupos. Quando estas ações estão relacionadas a uma compreensão sistêmica da realidade, temos maior chance de sucesso.

Nesse ponto, Foer apresenta uma mudança de perspectiva que nos ajuda a perceber a importância de cada um de nós: para o autor, o fato de uma ação individual ser impotente para uma grande mudança é exatamente o motivo para que todos nós tenhamos essa perspectiva proativa e tomemos a responsabilidade para o fazer. Uma ação individual é insuficiente, mas quando todos tentamos, os pontos dessa rede se ampliam, as conexões se estabelecem, e a grande teia em que vivemos se revela.

Refletindo sobre essa leitura, fico pensando nos pequenos movimentos em nossas salas de aula. No bom dia que damos aos alunos quando entramos em sala, na pergunta sobre como foi o final de semana. Na abertura para escuta, na tentativa diária de construir engajamento. Fico pensando nas formas de trocar com os colegas professores, nas reuniões, no café, nas redes e plataformas de troca, nos conselhos, em todos os espaços de diálogo onde podemos dividir o valor de nossas ações e multiplicar as possibilidades de transformação.

A educação é o caminho para transformação social, e a crise que vivemos, que coloca a cada dia a educação mais a serviço da operação de um projeto, da construção de pessoas que são treinadas para ser uma parte (descartável) de um sistema, se amplia.

Precisamos de mudanças individuais e coletivas. De movimentos pontuais, mas também sistêmicos.

Acima de qualquer coisa, precisamos da força de cada um, a serviço do coletivo.

Educar para transformar, educar para permitir a construção de caminhos para cada um é o grande objetivo que precisamos ter em uma sociedade onde parece que já definiram onde cada um de nós deve estar.

A educação pode mudar isso, e ações individuais podem não ser suficientes, mas isso depende da nossa compreensão do poder que cada um possui. Quando compreendermos isso, a mudança pode se tornar real.

Referências:

George Marshall. Don’t Even Think About It: Why Our Brains Are Wired to Ignore Climate Change Paperback.Bloomsbury USA, 2015

Jonathan Safran Foer. Nós somos o clima. Ed. Rocco, 2020

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Written by gustavo s de borba

Professor da Unisinos na área de Design. Escrevo aqui sobre o cotidiano, em um diário do período de pandemia, com textos de um ano atrás.

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