Ser colorado
Um dos momentos mais impactantes no South Summit foi a palestra do Piangers. Ele criou um espaço leve e descontraído para debater a importância da humanidade em um mundo governado pela tecnologia, e discutiu questões relacionadas a como nossa construção enquanto ser humano envolve parâmetros não quantificáveis e muitas vezes difíceis de compreender, que só se explicam em nossa subjetividade. O exemplo que ele escolheu para tangibilizar isso, baseado em histórias que eu e o Guto Massena dividimos com ele, foi a irracionalidade de ser colorado.
Ontem tivemos mais uma prova disso.
Torcer para o inter é assim: a gente sabe que em jogos como o de ontem, semifinal do gauchão, vamos perder. Mas acreditamos, sempre, que “dessa vez” vai ser diferente. Quando realmente é diferente, o que acontece vez ou outra, me parece que é uma questão de estatística: não vamos perder todas.
Em cada lance, em cada momento, celebramos a nossa irracionalidade emocional por ver nesse time algo inexplicável: pertencimento, conexão, amor.
Ser colorado é ver uma derrota como a de ontem, com pênaltis cobrados de um jeito único, como em tantas outras decisões que tivemos, e ainda assim achar que “é possível”ganhar. É sentir raiva, é dormir triste, é acordar chateado. É sonhar com os pênaltis mal batidos e levantar da cama sabendo que hoje ficou mais fácil para o Grêmio: que coincidentemente sempre joga um dia depois das piores derrotas do inter. Não basta perder, precisamos ver a vitória do arquirrival.
Ser colorado é dor, é sofrimento, e também por conta disso, resiliência, senso de coletivo, senso de pertencimento a um grupo que precisa um do outro.
Ser colorado é sofrer.
Mas quando o dia passa, quando as provocações dos amigos gremistas diminuem e a vida segue, esquecemos tudo isso. E rapidamente lembramos que temos o melhor time do Brasil e que, atualmente, temos mais 3 campeonatos pela frente. Nesse momento, a irracionalidade aponta na direção do argumento: “foi até melhor perder, assim podemos focar nos títulos que interessam”.
E assim seguimos. Em cada um dos campeonatos, começamos bem, avançamos algumas fases, criamos esperança para poder dizer que estamos, por exemplo, “fazem vários jogos sem perder”. O melhor ataque, a melhor defesa, os craques de seleção. Nos classificamos em primeiro lugar do grupo, ou, quando envolve pontos corridos, nos mantemos no topo quase até o final.
Aí, quando tudo parece certo, quando nada mais pode destruir a possibilidade concreta de sermos campeões com folga, conhecemos mais um degrau do desespero da derrota, sempre com contornos trágicos e novas possibilidades: pênalti batido com os dois pés ou com cavadinha, gol no último minuto, expulsão infantil e até, as vezes, uma interpretação errada da arbitragem.
Tudo isso faz parte desse cardápio infinito de possibilidades dramáticas que é ser colorado.
Ontem foi assim.
Mas também foi dia de ver o jogo com a Aninha, com a Laura, de conversar sobre a vida e de jantar um festival de pratos com atum. Torcer para o inter também tem isso: coloca pessoas que dividem a irracionalidade de ser colorado juntas e nos torna mais próximos.
Sempre lembramos “daquele jogo”, e geralmente é uma boa história.
Vai colorado, agora é foco na sul-americana.
Seremos campeões.
Sim, a estatística está a nosso favor.