Saudade
Essa semana recebemos 3 professores e 9 alunos da Purdue University aqui em Porto Alegre. Como sempre acontece, em um dado momento do dia me peguei explicando para eles duas coisas: o sentido da palavra Bah, que usamos aqui no Sul para expressar uma infinidade de sentimentos positivos e negativos, e a palavra saudade, que não tem tradução em inglês. Saudade. Para mim, uma palavra que se revela no dia a dia.
Tem dias que a saudade é tanta, que transborda do meu corpo. Cada lugar que vejo, cada música que escuto, cada pensamento que estaciona em minha cabeça me faz lembrar de uma delas.
Estar longe é um eterno exercício para aprender como celebrar o amor na ausência.
Mas com a saudade, vem também a busca de motivos para a distância, o orgulho dos caminhos percorridos, o respeito pela vontade de cada um de construir um lugar seu que pode ser melhor não apenas individualmente, mas em um espaço de inclusão de mais pessoas.
Minhas filhas se desenvolveram assim: olhando para o coletivo e se compreendendo como parte de algo maior. Hoje percorrem caminhos diferentes, mas que se cruzam nos espaços de construção coletiva que transformam as vidas delas e de outros.
Sempre que tenho saudades, penso nisso: não podemos dar limites para quem tem sonhos e possibilidades para realizá-los. Na prática, todos deveriam ter essa possibilidade, mas infelizmente não é assim.
Escuto agora uma música que me faz lembrar ainda mais e me pergunto: como uma canção que nunca escutamos juntos, que acaba de ser lançada, pode trazer tantas lembranças de momentos que se desenvolveram em sua plenitude em um espaço e momento em que a única representação dessa música era a sua inexistência?
Escuto mais uma, o disco acaba de ser lançado e a agulha percorre as ranhuras do vinil azul, que brilha na sala de minha casa e me entrega um som original, puro, sem zeros e uns, sem a ilusão criada pelos bits que recebemos no streaming e que chamamos, de certa maneira equivocadamente, de música.
Escuto uma canção que chama “me before you”. Uma música que celebra o amor que podemos ter quando encontramos alguém e nos comparamos com quem éramos antes daquele momento. Penso nisso, lembro de muita coisa, e agradeço pelas possibilidades que tenho a cada dia de me transformar. Aprendi na vida que cada encontro é um momento de transformação, de mudança, se nos abrirmos para as possibilidades de aprendizado que sempre temos no contato com outro ser humano. A música provavelmente é uma canção de amor, mas que se aplica, como metáfora, para qualquer encontro.
São 7:35 da manhã.
O dia todo pela frente para que possamos, mesmo longe, celebrar o amor, celebrar a vida, celebrar a possibilidade do encontro em algum momento futuro e aproveitar os momentos que teremos hoje. Momentos de transformação que se apresentam nas entrelinhas da nossa vida diária. Momentos que podem nos dar alegria, aprendizado, e por que não, mais saudade.