Qual a educação do futuro?

gustavo s de borba
4 min readOct 6, 2023

Essa é uma questão sempre presente no nosso dia a dia como educadores, pais, gestores, ou interessados no tema. A cada dia novas tecnologias surgem e novos elementos para este debate se configuram. O espaço online, o metaverso, o uso de celular em sala de aula, a inteligência artificial, são apenas alguns dos exemplos que estão em nosso discurso e que geram uma potencial angústia naqueles que precisam trabalhar com os estudantes.

Quando penso nos fatores que realmente fazem a diferença em nossas salas de aula, ou mesmo nos ambientes educacionais corporativos, percebo 3 conceitos centrais para termos resultados de aprendizagem: pertencimento, bem-estar e engajamento.

Sem qualquer um destes conceitos, torna-se difícil desenvolver em sua plenitude o ato de aprender. Por isso, quando falamos em educação do presente ou do futuro, precisamos percorrer estes conceitos compreendendo melhor os caminhos que surgem nas conexões entre eles, ou mesmo nos espaços livres que ficam em suas bordas, locais para pensarmos em potenciais inovações. Afinal, é lá que elas surgem, no lugar do imprevisível.

Bem-estar: Quando pensamos nas crianças ou nos jovens adultos, mesmo entendendo que os seus processos são bastante diferentes, existem elementos em comum, como a necessidade de bem-estar. A obsessão por resultados acadêmicos acaba muitas vezes anulando outros espaços fundamentais, como a compreensão da necessidade de cuidado com a saúde mental e de reconhecimento das individualidades de cada aluno, para que possamos contextualizar o seu aprendizado e gerar bem estar. Quando reconhecemos cada um potencializamos os ganhos coletivos e temos ainda mais espaço para o novo.

Pertencimento: A necessidade de pertencimento decorre da complexidade dos ambientes reais e virtuais que frequentamos. Pertencer é uma necessidade para aprender. Quando pertencemos ao grupo, nos sentimos a vontade, seguros para compartilhar. E quando compartilhamos, quando verbalizamos, refletimos, ouvimos o outro, e ampliamos nosso olhar, ampliamos nossas ideias, aprendemos mais. Precisamos fomentar nas escolas espaços para isso, construindo um lugar de pertencimento. Entretanto, esse pertencimento deve desafiar as bolhas sócio-culturais nas quais vivemos. Precisamos pertencer em espaços mais diversos, onde nossa voz agrega o novo, e onde a voz dos outros é a novidade para nós. Nesses lugares, surge um coletivo único, e a partir do respeito mútuo, renovamos nossas possibilidades enquanto um grupo de humanos.

Engajamento: O engajamento é um terceiro fator fundamental, que surge a partir do momento que reconhecemos valor intrínseco nas atividades. Hargreaves e Shirley apontam para esse ciclo: valor intrínseco (encantamento), importância (significado social, propósito), associação (aprender com os outros), empoderamento (confiança em sua capacidade) e maestria (busca da excelência). Essas etapas todas fazem parte deste processo que os autores chamam de ciclo do engajamento dos estudantes.

Mas se considerarmos esses 3 pontos, qual o futuro da educação?

Precisamos identificar maneiras de desenvolver nos espaços de aprendizagem estes 3 processos: geração de engajamento, pertencimento e bem-estar. E para fazer isso, precisamos de competências humanas.

O futuro da educação faz uma curva e encontra em cada um de nós o potencial de transformação, a partir de nossas competências. A tecnologia pode sim nos apoiar, e em muitos processos é viabilizadora do que realmente faz a diferença no processo de aprender: o encontro entre humanos.

Pensar no futuro da educação é pensar em projetar currículos, projetar espaços, formar professoras e professores, ampliar o olhar da sociedade para a importância desse lugar, que pode transformar a vida de cada aluno, e de tantos outros, a partir da sua formação escolar.

O futuro da educação se confunde com o nosso futuro. E na realidade, não existe. Não existe para além de uma abstração criada por nós, que em boa parte do tempo nos faz adiar as decisões e ações que precisamos tomar em outro tempo verbal: no presente. Não temos mais tempo, por exemplo, para adiar uma mudança em nossa relação com a Terra. Da mesma forma, precisamos agora promover a transformação da educação. Trata-se do presente da educação, da mudança que pode gerar transformação social, com respeito mútuo e a inauguração de novas possibilidades logo ali na frente, nos momentos decorrentes do hoje, que escorregam na linha de tempo imaginária que criamos para dar lógica a nossas vidas.

As convenções definem nossa sociedade, e passado, presente e futuro acabaram sendo definidos como espaços temporais lineares e conectados um no outro. Mas o passado está sempre conosco, e precisamos revisitar este lugar, buscando nossa ancestralidade, para significar o momento e projetar o que está por vir.

O nosso presente passa pelo reconhecimento da nossa força, como professores, de um coletivo. Um grupo com competências múltiplas, que não será substituindo por máquinas com competências pontuais.

A beleza da humanidade está na ambiguidade, na possibilidade do erro e na nossa imperfeição. E quando entendemos isso melhor, aprendemos mais e podemos transformar nosso coletivo. E talvez dessa forma, possamos tirar da pauta a preparação para o que está por vir e pensar no estar, no “bien vivir”, e na vida digna que todos merecem aqui e agora.

Obs.: Texto desenvolvido para apresentação no Oktober Summit

Fontes:

Shirley, Dennis; Hargreaves, Andrew. Cinco Caminhos para o Engajamento: Rumo ao Aprendizado e ao Sucesso do Estudante (Portuguese Edition). Editora Penso, 2023

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Written by gustavo s de borba

Professor da Unisinos na área de Design. Escrevo aqui sobre o cotidiano, em um diário do período de pandemia, com textos de um ano atrás.

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