Quais são as tendências no ensino superior para 2024?
Desde 2010 acompanho vários relatórios de tendências educação, especialmente o Horizon Report, que era publicado pela New Media Consortium (NMC) e EDUCAUSE Learning Initiative (ELI), e agora segue sendo publicado pela EDUCAUSE. Os relatórios podem ser acessados nos links ao final do texto.
Durante um longo período, a cada ano, eles faziam uma projeção da adoção de tecnologias emergentes no ensino superior considerando 3 perspectivas: curto, médio e longo prazo. Em 2010, por exemplo, se falava em conteúdo aberto e celulares com capacidade computacional, como tendência de curto prazo (um ano), livros eletrônicos e realidade aumentada, para 2 a 3 anos, e computação baseada em gestos e análise visual de dados, para 4 a 5 anos.
Muitas das tecnologias ali identificadas não se concretizaram nos espaços de ensino superior, mas nos ajudaram a ter um olhar mais sistêmico sobre as possibilidades que emergem dos diferentes tipos de tecnologia e de sua respectiva aplicação.
Até 2019, estes relatórios além de apresentarem as tecnologias chave, também traziam os desafios para adotar tecnologias no ensino superior. No relatório de 2019, por exemplo, aparecem como problemas com maior complexidade para sua resolução a busca por equidade digital e o repensar das práticas de ensino. Neste mesmo relatório, questões relacionadas ao redesenho dos espaços físicos aparecem como algo de curto prazo. Cabe lembrar que estávamos no ano anterior a pandemia.
Desde 2020, o relatório mudou um pouco em seu formato, apresentando agora tendências classificadas em 5 dimensões: social, tecnológica, econômica, política e educação superior; além de cenários futuros, e do foco em tecnologias e práticas emergentes. Este último item é o que tem maior impacto no que busco discutir neste breve texto.
Em 2020, as práticas envolviam tecnologias de aprendizagem adaptativa, machine learning, o uso de analytics para o sucesso dos alunos, questões relacionadas ao design instrucional, educação aberta e tecnologias de realidade aumentada.
A pandemia impactou nesse olhar e no ano seguinte, 2021, dentre as seis tecnologias chave pelo menos três tinham relação com as mudanças para o espaço online: modelos de cursos híbridos e blended, qualidade do ensino online, recursos de educação aberta. Além destes, microcredenciais, learning analytics e inteligência artificial apontavam como as tecnologias importantes naquele momento.
A cada ano, como era de se esperar, pode-se perceber um aprofundamento na maioria dos tópicos definidos como tendências e o surgimento de algo que está em debate naquele momento. Algo novo, que provavelmente nasce a partir da implementação de algumas destas tendências. Em 2022, essa questão estava focada no professor: a importância da formação do professor para ambientes remotos e híbridos.
Na minha compreensão, essa tendência se colocava como um elemento essencial para que o potencial relacionado as mudanças de formato, de currículo e de tecnologia, pudessem efetivamente gerar ganhos em termos de aprendizagem. Além do foco no professor, apareciam novamente as microcredenciais, o debate sobre espaços híbridos de aprendizagem, sobre modos remotos de aprendizagem e a perspectiva da inteligência artificial se desdobrando em learning analytics e ferramentas de aprendizagem.
Em 2023, as tendências seguiram em 3 frentes:
- questões relacionadas a inteligência artificial;
- microcredenciais;
- ambientes de aprendizagem: as modalidades (híbrido, presencial, online) em certa medida desaparecem e se tornam uma coisa só.
A novidade de 2023 não envolvia diretamente o professor, mas sim o aluno. Estava relacionada a busca do desenvolvimento de um senso de pertencimento e conexão.
Para o ano de 2024, aparecem muitas tendências, especialmente ligadas ao uso de tecnologia. Do ponto de vista do ensino superior, por exemplo, muitas universidades já estão desenvolvendo capacitações para seu corpo docente apontando para caminhos de uso do ChatGPT, sobre como inserir estas questões no plano de aula, e como aprender a partir do exemplo de nossos pares. Recentemente realizei um treinamento em uma Universidade americana que tinha como foco Inteligência Artificial na Educação, e estava disponível para todo o corpo docente.
A partir dos últimos anos do Horizon Report, me parece que podemos inferir que temos 3 tendências bem consolidadas:
1- Inteligência artificial: nas possibilidades de personalização do ensino para o aluno, apoio ao professor, entre outras.
2- Espaços e modalidades: construindo conveniência, permitindo ao aluno escolher o que faz mais sentido para ele, ressignificando os termos online, presencial e híbrido.
3- Avanço das microcredenciais: que envolvem certificados ou competências reconhecidas em áreas especificas, geralmente relacionadas a cursos curtos e em espaços de inovação e interação com o ambiente de trabalho. Cabe aqui dizer que no relatório de 2022, fomos citados neste aspecto a partir de um projeto que nasceu com a Unisinos Lab e se desdobrou no Lab tools, buscando oferecer atividades autoinstrucionais com foco profissional para alunos, cocriadas em parceria com organizações.
Mas para além destes três pontos, arrisco enfatizar algo que pode ser percebido como tendência, mas também como necessidade.
Aqui cabe essa reflexão: boa parte das tendências representam caminhos possíveis, espaços que podem facilitar ou encurtar processos, mas não são de fato uma necessidade.
Boa parte da maravilhosa tecnologia que temos apoiando o ensino, se desaparecesse, não inviabilizaria o que mais se busca na educação: a aprendizagem significativa de alunos e também de professores. Mas para acontecer aprendizagem, temos algumas necessidades que se tornaram ainda mais importante a partir dos últimos anos, devido a pandemia de covid-19 e também ao forte avanço das tecnologias. Estas tendências/necessidades se configuram como: a importância de promoção do bem-estar, desenvolvimento de engajamento e de um senso pertencimento do aluno. Estes elementos estão relacionados ao cuidado com o ser integral que habita nossas salas de aula, especialmente com a sua saúde mental. Sem isso, me parece muito difícil avançar em um processo de ensino e de aprendizagem que gere bons resultados.
Compreendo que um dos principais caminhos para desenvolver estes 3 elementos necessários e que transformam o ensino superior, é o uso do design estratégico como promotor do desenvolvimento de espaços e de competências no ensino superior, e também nas escolas. A perspectiva do Design estratégico nos ajuda desde a concepção do currículo, passando pela formação dos professores e chegando até a projetação do encontro entre professores e alunos. Esse é o espaço transformador.
Em 2024, acredito que a tendência é ser mais humano, resgatar vínculos e afetos e desenvolver um senso de coletivo, onde todos aprendem juntos, mas de diferentes maneiras e em diferentes tempos. A tecnologia estará lá, como tendência. Mas o que precisamos é de conexão humana.
Alguns dos relatórios Educause:
2023:https://library.educause.edu/-/media/files/library/2023/4/2023hrteachinglearning.pdf
2022:https://library.educause.edu/-/media/files/library/2022/4/2022hrteachinglearning.pdf?#page=15
2021:https://library.educause.edu/-/media/files/library/2021/4/2021hrteachinglearning.pdf
2019:https://library.educause.edu/-/media/files/library/2019/4/2019horizonreport.pdf
2018: https://library.educause.edu/resources/2018/8/2018-nmc-horizon-report
2014: https://library.educause.edu/-/media/files/library/2014/1/hr2014-pdf.pdf
2010: https://library.educause.edu/resources/2010/1/2010-horizon-report