PISA: para onde vai a educação do Brasil?

gustavo s de borba
3 min readDec 6, 2023

Para avaliarmos precisamos medir.

Essa é uma das principais certezas que temos nas diferentes organizações públicas e privadas e que acaba moldando a forma como agimos. Quando investimos em algo, quando lançamos um novo produto, utilizamos indicadores para avaliar o impacto daquela ação. Precisamos disso.

Em diferentes campos, este processo de medição gera rankings, que permitem a comparação das organizações que atuam no mesmo setor. Como diretor de graduação, vivi 10 anos este processo de compreensão dos rankings para buscar melhoria em nossa graduação e chegar a condição de “a melhor do Brasil” (o que ocorreu com a Unisinos algumas vezes). Mas como desenvolver este processo?

Uma das formas de compreendermos como estamos em comparação com momentos anteriores ou com outras organizações ou países, são os testes padronizados.

Embora estes testes apresentem limitações relacionadas a, por exemplo, a busca por um padrão único independente dos diferentes contextos, eles são reconhecidos como importantes balizadores para avaliação de políticas públicas. No campo da educação, um dos principais testes é o proposto pela OCDE, o PISA, que é realizado a cada 3 anos.

Esta semana recebemos os resultados, e não existe muita surpresa com relação aos países mais bem posicionados no ranking, em sua maioria asiáticos.

Algumas variáveis aparecem como relevantes para entender o desempenho. Uma delas, que ouvi da professora Claudia Costin, é o fato de a maioria dos países melhor posicionados possuir educação tempo integral. Com os alunos mais tempo na escola, podem surgir mais possibilidades de aprendizagem, especialmente quando vivemos em contextos de desigualdade.

Um outro ponto importante é entender o nível de investimento de cada país em educação. Existe uma correlação entre recursos aplicados e resultado e isso passa por muitos fatores, como a qualificação dos professores e dos espaços físicos.

Esse é um dos pontos comentados por Pasi Sahlberg, um dos grandes nomes da educação na Finlândia, que atualmente vive na Australia e escreveu para o The Guardian comentando a melhora do país em que vive no PISA. Ele coloca que um dos grandes desafios é atacar as desigualdades do sistema (que no nosso caso são ainda maiores) e também olhar formas de retomar o engajamento dos alunos e o bem estar geral. Um ponto complementar é analisar o que outros países, que estão melhorando em termos educacionais, estão fazendo.

Em matéria publicada na Folha de São Paulo, assinada por Paulo Saldaña, um dos pontos identificados e que devemos considerar é o fato de termos melhorado em termos de posição ranking, embora tenhamos tido uma queda nas notas. Aparentemente caímos menos do que outros.

Mas para que serve esse ranking?

Quando recebemos uma avaliação que nos apresenta os desafios que temos podemos identificar se as politicas e ações que estamos tomando estão na direção certa, podemos aprender com as instituições ou países que estão nas melhores posições, abrimos espaço para discutir a implementação de fatores que são absolutos neste processo (no caso da educação a importância do turno integral, por exemplo, que tem avançado no Brasil) e por último, mas também importante, podemos questionar a aderência dos testes padronizados a realidade especifica que vivemos. Precisamos medir, precisamos de evidências, mas precisamos compreender o contexto de cada país.

Finalizo essa breve reflexão colocando aqui uma ideia proposta por Andy Hargreaves e Dennis Shirley no Livro The Age of Identity. Eles discutem sobre os impactos que eventos como conflitos armados, pandemias, entre outros, acabam tendo nos alunos, pois estes são afastados dos espaços de aprendizagem e por isso acabam perdendo o hábito de aprender e de se motivar para isso: perdem o engajamento. Na opinião dos autores, a busca desenfrada por recuperação e a aplicação de testes acaba ampliando a falta de engajamento. Deveríamos ir na direção oposta: primeiro engajar, reconectar, desenvolver novas práticas, e depois disso testar.

Em um período pós pandemia, o PISA nos dá um retrato deste momento, mas por dentro deste teste, talvez mais do que em outros momentos, estando inseridas novas variáveis, ou as mesmas variáveis com um potencial maior de impacto: falta de engajamento, de bem-estar, de identidade. Está ali colocado o gap não só de aprendizagem, mas também em certa medida existencial, que a pandemia nos deixou. Esse deve ser o principal motivo da piora coletiva no teste.

Temos agora que avançar, sem desespero, para um lugar melhor.

Para isso, precisamos de políticas públicas e da busca constante pela qualificação do momento de conexão entre professores e alunos, é nesse momento que está a chave para o potencial transformador da educação: a qualificação do momento do encontro entre aqueles que se transformam através do ato de educar.

Sign up to discover human stories that deepen your understanding of the world.

Free

Distraction-free reading. No ads.

Organize your knowledge with lists and highlights.

Tell your story. Find your audience.

Membership

Read member-only stories

Support writers you read most

Earn money for your writing

Listen to audio narrations

Read offline with the Medium app

gustavo s de borba
gustavo s de borba

Written by gustavo s de borba

Professor da Unisinos na área de Design. Escrevo aqui sobre o cotidiano, em um diário do período de pandemia, com textos de um ano atrás.

No responses yet

Write a response