Meu relógio
Eu nunca usei relógio. Na realidade, usei quando era menino, aqueles que trocam pulseiras e que permitiam a cada dia usar um relógio de cor diferente. Ganhei da minha mãe e pelo que me lembre o exemplar veio do Paraguai, de ônibus, nas clássicas excursões semanais que muitos faziam de Santa Maria para a fronteira paraguaia, buscando eletrônicos, cigarros e outros objetos para comercializar por aqui. Eu lembro ainda de um que meu vô tinha, que era digital e que tinha como despertador o cacarejar de um galo, que ocorria sempre antes do relógio dizer as horas, em espanhol, “son las siete horas”.
Fora esses relógios, lembro de um que eu sempre admirei: o relógio de bolso do meu vô. Eu gostava de perguntar as horas e ver ele puxando aquele cordão prateado, que parecia uma jóia, e trazia na ponta o relógio. Mas na realidade, nunca gostei de usar nada no pulso, e usar relógio para mim era a prova de que realmente o tempo nos controla.
Quando comecei a correr, isso tudo mudou. Eu precisava saber muitas informações que podem ajudar corredores iniciantes e experientes: qual o meu ritmo? Quanto tempo passou? Como está minha frequência cardíaca? Essas e outras perguntas me fizeram decidir comprar um relógio para realizar as minhas corridas. Mas com esta decisão veio a complexidade de entrar em um universo com infinitas possibilidades, marcas, tipos, pesos. Garmin, Xiaomi, Samsung, Apple, Polar, entre outras marcas, qual devo comprar? E entre estas marcas, qual modelo? Só a Garmin, por exemplo, deve ter dezenas de modelos.
Quando decidi que iria comprar um relógio, pensava apenas na funcionalidade. Queria algo leve e que me desse as informações necessárias para que eu desfrutasse de uma corrida sem maiores preocupações.
Quando as opções são muitas, qual o melhor caminho a seguir?
Eu escolhi o mais seguro, perguntei para meus amigos que corriam e que já tinham relógios. Comprei um que uso até hoje. Já dura 5 anos aqui no meu braço.
O relógio de um corredor é um instrumento de navegação e de segurança. Pode também ser um adorno, ter efeito estético, mas acima de tudo precisa nos ajudar com as informações que precisamos para aquele momento.
No meu caso, comprei um simples. Mas acabo de me dar conta de uma coisa. Hoje estou usando-o, com pulseira vermelha. Tenho uma verde e uma preta em casa. Acho que, inconscientemente, voltei a usar o meu relógio de menino. Faz sentido, por que as outras duas referências que eu tinha, seriam inviáveis: um, literalmente pesaria no bolso e poderia cair, o outro, seria no mínimo inusitado: ter um galo cacarejando e dizendo, “han pasado 20 minutos”. Dentre as possibilidades, acho que fiz a melhor escolha, e hoje quando corro, trago comigo estas memórias afetivas do tempo em que eu era criança, independente da cor da pulseira que uso. Embora a minha preferida, seja a vermelha.